sábado, maio 19, 2007

Janaína sentada na parada de ônibus observava, como era de seu costume. Dessa vez, duas crianças, aparentemente irmãs. Uma, tagarela, com jeitos de gente grande dizia - Deus me livre a cada automovel que passava em alta velocidade. A outra, quieta, calada fez logo Janaína se reconhecer. Pensava se seria regra: entre duas irmãs sempre haveria a de língua solta e a observadora! Admirava a pele das crianças. Era aquilo mesmo que diziam: pele lisa, sem deformidades.
Janaína achava engraçado os modos da faladeira (em outra oportunidade seriam motivo suficiente para provocar-lhe irritação; mas hoje não, hoje estava bem apreciadora das coisas da vida, inclusive as irritantes... tanto é que nem se incomodou quando a tal gordinha começou a mexer pra lá e prá cá num ferro provocando um rangido fino), observava sua roupinha pequena, de desenhinhos: um short amarelo com florzinhas bordadas, uma blusa rosa com o desenho de um cachorro, um boné também rosa, com um personagem de história em quadrinhos e as pequenas unhas, da mesma cor, de esmalte descascado.
Janaína pensava que, quando era pequena certamente também se vestira daquela forma. Mas, questionava-se se nessa época reparava ou não nesses detalhes, florzinhas, bordados, desenhos. Talvez não. Então, se as crianças não reparavam naquilo, pra que se desperdiçava atenção a tais banalidades? Cogitou, então, que podia acontecer delas, eventualmente guardarem um desses detalhes na memória.É, podia ser que fosse esse o motivo de sua existência, como era o caso de um broche de palhaço que ela própria tivera. Lembrava-se bem, tinha cabelos de uma espécie de pena vermelha e rosto branco de porcelana. Era isso: o palhaço era o responsável por puxar toda a linha de sua memória. Ou não?