quarta-feira, julho 01, 2009

Pedra do Amor


Um dia a gente tava ali sentado conversando e daqui a pouco reparamos numa pedrinha ali perto. Toda vez que a gente se reunia tava a pedrinha lá, no mesmo lugar. No começo a gente achava estranho, nunca tínhamos visto pedra igual. No primeiro dia que a vi tive uma raiva danada, fui passar e tropecei nela. Depois foi Amanari quem tropeçou. A gente não entendia o que ela tava fazendo ali. O único que parecia saber o mistério da pedra era FeiJãozinho. Afinal tinha sido ele quem a tinha colocado ali. Mas, sempre que lhe perguntávamos sobre ela, ele respondia com um sorriso mais enigmático ainda.

O tempo passou e a pedra continuou lá. Mas, agora ela já tinha revelado um de seus segredos: era uma pedra mágica. Era só colocá-la na mão e fechar o punho bem apertadinho, pedir um desejo e pronto: a gente conseguia o doce mais gostoso, ou se teletransportava pra onde a gente quisesse. Aos poucos, a pedrinha ia revelando seus segredos. Descobri depois que ela era, na verdade, uma pedra-concha, se você encostasse o ouvido bem pertinho e se concentrasse, saíam dela os conselhos que você precisasse naquele momento. Saíam na forma de música, uma mistura de trompete, pífano e rabeca. E a pedra também sabia dançar! Acreditem se quiserem, mas, ao escutar qualquer som da mata, ela se lembrava de seus antepassados e dançava os folguedos mais bonitos que já se viu. Ela também tinha mania de organização, onde estivesse, o ambiente estaria com as coisas milimetricamente em seus lugares, isso até irritava um pouco às vezes.

Mas, a principal característica da pedrinha era sua ousadia. Quando descobrimos o percurso que ela tinha feito para chegar ali tomamos um susto. Ela tinha nascido numa floresta enorme, onde tudo era aparentemente perfeito, harmonioso. Ela era um dos pedaços de uma rocha que saía do mar e era gigante, tão grande que chegava a tocar o céu. Um dia veio um vento muito forte e gerou a pedrinha. Só que a partir daí ela teve que aprender a se virar sozinha, distante de sua rocha-mãe. No começo, os irmãos dela a acompanhavam. Mas, logo, a pedrinha sentiu necessidade de se separar. Ela começou a querer encontrar outro lugar, onde se sentisse em casa de verdade. Ela enxergava além dos outros seres da floresta. Percebia que faltava alguma coisa ali, algo que para ela era essencial. Mas não sabia bem o que era, só tinha certeza que seu lugar não era ali.

Foi aí que ela teve uma idéia. No dia de seu aniversário, 29 de junho, quando o sol batesse o primeiro raio na superfície dela, ela teria o direito de fazer, pela primeira vez,para si mesma, os pedidos que sempre realizara pros outros até então. Assim, quando esse dia chegou, desejou com todas as suas forças encontrar outro lugar, onde as pessoas fossem iguais a ela. Não se sabe muito bem o que aconteceu, mas o fato foi que ela não se moveu do lugar. Não aconteceu nadinha, nadinha. Então, a pedrinha ficou muito triste. Mas mesmo assim não desistiu de realizar seu sonho. Sabia que todas as quartas-feiras passava um caminhão na floresta. Ele era bonito que só, todo colorido. A pedra-concha sempre tinha ficado intrigada com aquele carro enorme que sempre ecoava uma música bonita. Aí, ela esperou a quarta-feira chegar com a maior ansiedade do mundo. E ela chegou. Quando escutou o som do caminhão se aproximando lá de longe - pois seu ouvido de concha era bem apurado -, pegou uma carona com um passarinho amigo seu e entrou nele.

Hoje a pedrinha não sabe bem se encontrou o lugar que procurava, e pode ser que ela nunca venha a saber. A única coisa que posso garantir a vocês é que ela consegue fazer muita gente feliz. Não com seus poderes mágicos de levar onde a gente quiser, de fazer aparecer pães sucos e comidas gostosas, mas, com algo que tá lá no fundo dela e que lhe deu seu sobrenome. Não contei até agora, mas o nome dela completo é Pedra do Amor. Seu pai, o vento, tinha lhe dado esse nome porque logo quando ela nasceu, ele percebeu de cara qual era o bichinho que a pedra-concha possuía lá dentro.